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Agropecuária Brasileira: Como reverter as emissões de gases de efeito estufa?

28/08/2014



Artigo de Marina Piatto e Ciniro
Costa Junior
A
agropecuária, o desmatamento e a degradação florestal contribuem com 22% das
emissões globais de gases de efeito estufa (GEE), segundo o Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente. No Brasil, para o ano de 2012, o impacto do
agronegócio eleva esse número para 64%, sendo 32% devido ao desmatamento, 30% são
emissões diretas causadas pelo sistema de produção e 2% são provenientes do uso
de energia na agricultura. Estes dados e outras recomendações para redução de
emissões de GEE estão descritas no estudo realizado pelo Observatório do Clima:
Análise do Panorama Atual
de Emissões Brasileiras: Tendências e Desafios.

Segundo
o relatório de análise do setor agropecuário,
coordenado pelo Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola
(IMAFLORA), 65% das emissões deste setor foi proveniente diretamente dos
bovinos de corte, 13% da pecuária de leite, 7% de fertilizantes nitrogenados e 6%
da produção agrícola (soja, cana-de-açúcar, feijão, arroz, milho, algodão e
mandioca). O restante das emissões (9%) foi decorrente de outras atividades,
como a de criação de suínos e aves e do cultivo agrícola em solos orgânicos. País
detentor da maior biodiversidade do planeta e um dos maiores produtores de
carne, grãos e biocombustíveis, o perfil das emissões de GEE brasileiras traduz
a falta de planejamento para a expansão agropecuária, causando degradação ambiental,
seguida da baixa eficiência dos sistemas produtivos em algumas regiões. A
pecuária de corte, por exemplo, ocupa uma área de, aproximadamente, 180 milhões
de hectares, das quais cerca de um terço estão degradadas. Em alguns casos os pecuaristas não possuem
recursos para investir na melhoria destes pastos ou não têm acesso a técnicas que
possam aumentar a produtividade de seus sistemas. Assim, à medida que o pasto
perde a produtividade, mais áreas naturais são abertas.  Estima-se que até
2022 o Brasil necessitará expandir sua área agrícola em cerca de 7 milhões de hectares
e produzir 30% mais carne bovina para suprir demandas por alimentos no mundo,
segundo o Ministério Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Esse cenário pressiona
o país a buscar alternativas para aumentar sua produção e ao mesmo tempo reduzir
suas emissões de GEE. 
O relatório do Observatório
do Clima mostra que a recuperação dos pastos degradados no Brasil poderia reduzir
400 milhões de tCO2eq até 2020. Somando-se a diminuição do
desmatamento e maior eficiência de manejo do rebanho, cerca de 4 bilhões de tCO2eq
poderiam ser reduzidos, segundo estudo liderado pelo Instituto Internacional
para Sustentabilidade (IIS). Esse volume de carbono é superior à meta de
redução brasileira para 2020, onde o compromisso é de reduzir as emissões em mais
de 36% (cerca de 1,2 bilhões de tCO2eq).
De acordo com o Instituto
de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), pastos bem manejados, além de serem
mais lucrativos, reduzem em 48% as emissões de GEE por quilo de carne produzida.
Outro estudo, liderado pelo IIS, mostra que se as pastagens cultivadas no
Brasil passassem do atual potencial produtivo de 33% para 51%, seria disponibilizada
área suficiente para as futuras necessidades agrícolas (produção de grãos,
fibra, biocombustíveis e madeira) sem ocasionar novos desmatamentos. 
A contribuição
dos fertilizantes nitrogenados, responsáveis por 7% das emissões de GEE na
agropecuária em 2012, também pode ser reduzida, evitando-se o desperdício no momento
da aplicação do adubo e cultivando plantas fixadoras de nitrogênio. Pesquisadores
das universidades de Harvard e de Minnesota (EUA) estimaram que 50% do
nitrogênio aplicado para a produção de cereais no mundo são desnecessários. A Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), por sua vez, apresentou
recentemente uma variedade de milho (uma das culturas que mais demandam nitrogênio
no Brasil) capaz de fixar esse elemento por meio de microrganismos que vivem em
simbiose com as raízes dessa variedade. 
Ações como
essas, voltadas ao aumento de produtividade, eficiência e planejamento do uso e
manejo do solo, levarão o país a um patamar de produção com baixas emissões de carbono
e aliado a conservação da biodiversidade. Para conciliar estas demandas, são
necessárias políticas públicas bem orientadas. A redução contínua da prática de
queima da cana-de-açúcar é um bom exemplo. O relatório de análise das emissões
de gases de efeito estufa mostra que após o decreto federal que determinou a eliminação
da queima da cana até 2021, as emissões de GEE foram reduzidas em 32% entre
2008 e 2012 e ao mesmo tempo a produção de cana aumentou em 20%. Isto significa
que atualmente produzimos mais cana com menor emissão de carbono.
Nesse contexto, o
Plano Nacional sobre Mudanças do Clima (PNMC) deve cumprir importante papel em reduzir
as emissões de GEE no Brasil. No setor agrícola e pecuário foi elaborado o Plano
ABC (agricultura de baixo carbono), onde as estratégias e ações deverão contribuir com 22,5% da meta
brasileira de redução das emissões de GEE, são elas: recuperação de pastagens
degradadas, integração lavoura-pecuária-floresta, sistema plantio direto,
fixação biológica do nitrogênio, florestas plantadas e tratamento de dejetos
animais. 
A análise apresentada no relatório do setor agropecuário do Observatório
do Clima mostra que o Plano Agrícola e Pecuário de 2013/2014 totalizou R$ 136
bilhões, sendo que o recurso destinado ao Plano ABC no mesmo ano foi de R$ 4,5
bilhões, correspondendo apenas a 3,3% de todo financiamento voltado ao setor
agropecuário. O Pronamp (Política de Apoio ao Médio Produtor Rural), naquele
ano, por exemplo, contou com o recurso de R$ 13,2 bilhões quase 3 vezes maior
que o recurso destinado ao ABC.  
Adicionalmente, o relatório de análise destaca
a falta de sinergia entre as políticas agrícolas brasileiras onde a maior fatia
dos recursos pode estar financiando práticas que atuam na contramão da meta de redução
das emissões de GEE nacionais. Esse pode ser o caso do Plano Safra
da Agricultura Familiar, o qual não demostra esforços relacionados a redução de
emissões de GEE, entretanto, pode estimular a agricultura de baixo carbono em mais
de 4,5 milhões de propriedades familiares em cerca de 105 milhões de hectares. 
O
setor agrícola tem enfrentado uma encruzilhada de questões relacionadas a
segurança alimentar, energética, qualidade de vida no meio rural e sustentabilidade
ambiental em um contexto de importantes e difíceis acordos climáticos e novas
metas de redução de GEE pela comunidade internacional pós-2020. No Brasil, as
políticas públicas devem focar em tecnologias de baixo carbono para aumentar a
eficiência da produção agropecuária e ao mesmo tempo reduzir as emissões. Nesta
direção será possível posicionar o setor como captador de carbono e compensar a
emissão de outros setores que eventualmente terão limitações tecnológicas para
crescerem de forma limpa. Entretanto, o país ainda tem muito trabalho pela
frente para adotar essas tecnologias e transformar o problema em oportunidade.

………………………………………………………………………………………………………………………….1. Marina
Piatto é Coordenadora Sênior da Iniciativa de Clima e Agricultura do Imaflora
(Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola – www.imaflora.org)
responsável por projetos de emissões de GEE na agricultura, salvaguardas
socioambientais de REDD+ e compromissos empresariais para sustentabilidade.2. Ciniro
Costa Junior é Doutor em Química na Agricultura e Ambiente pela Universidade de
São Paulo e Consultor do Imaflora para assuntos do clima.* Elaborado a partir da
Análise do Panorama Atual de Emissões Brasileiras – Tendências e Desafios, do
Observatório do Clima. Leia mais sobre a Análise aqui.

Sobre o Observatório do Clima:

O Observatório do Clima é uma rede que reúne entidades da sociedade civil com o
objetivo de discutir a questão das mudanças climáticas no contexto brasileiro.
O OC promove encontros com especialistas na área, além de articular os atores
sociais para que o governo brasileiro assuma compromissos e crie políticas
públicas efetivas em favor da mitigação e da adaptação do Brasil em relação à
mudança do clima.

Saiba mais em: http://www.oc.org.br/Originalmente publicado por EcoDebate,
27/08/2014


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