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Dá para negociar saúde e segurança?

05/05/2015

Luís Fernando Guedes Pinto e Katia Maia
Direitos trabalhistas e
conquistas socioambientais tem sido vítimas da voracidade pelo crescimento
econômico no país. Em nome da competitividade de determinados setores, especialmente
o agropecuário, grupos conservadores ameaçam o interesse público e a natureza.
Após a diminuição da proteção das florestas, a segurança e a saúde dos
trabalhadores rurais devem ser apontadas como os próximos obstáculos ao
desenvolvimento.
Interesses econômicos de
curto prazo organizados no Governo Federal e no Congresso Nacional consideram
que direito a alojamento com cama, colchão e lençol, banho quente, banheiros
limpos, exames médicos rotineiros, comida quente e água fresca, tratores com cinto
de segurança e proteção contra capotamentos, ônibus seguros e equipamentos de
segurança pra colher frutas e aplicar agrotóxicos são um custo e um ônus para a
competitividade da agropecuária.
Está na mira desse grupo a
revisão e o desmanche da NR 31, norma regulamentadora federal que trata da
saúde e segurança no trabalho no meio rural. 
Ela garante ao trabalhador um ambiente de trabalho seguro e saudável.
Ela preconiza a gestão da segurança, visa prevenir acidentes, enfatiza o
treinamento, a higiene, o fornecimento de equipamentos de proteção, um ambiente
digno para o repouso do trabalhador e outros aspectos fundamentais.
Estamos falando da vida de
aproximadamente quatro milhões de mulheres e homens assalariados que trabalham
no campo em todas as regiões do país. Apenas 40% estão entre os “privilegiados”
com carteira de trabalho assinada e ganhando por volta de um salário mínimo.
Muitos são temporários e migrantes, trabalhando na colheita de cana, café,
laranja e outras culturas.
A rotina deles é o trabalho
ao sol aplicando agrotóxicos, operando máquinas e tratores, manuseando
ferramentas pesadas e perigosas, colhendo frutos, carregando peso e fazendo um
esforço físico intenso; frequentemente fazendo horas extras nos períodos de
pico de produção. Se alimentam de comida fria no campo, vivem em alojamentos ou
moradias provisórias nas cidades. Sabe aquele banheiro que você usa ao longo do
dia e a água fresca que mata a sua sede no escritório? Pois é, não há. São mais
de 5.000 trabalhadores intoxicados por agrotóxicos por ano no Brasil, com mais
de 100 mortes, muitas delas por suicídio. Os acidentes e mortes por capotamento
de tratores acontecem a dezenas por ano, mas tudo isto muito sub-notificado.
Enfim, é um trabalho pesado
e penoso. Estes trabalhadores vivem menos que a média dos brasileiros e como
consequência tem o direito até de se aposentar anos antes dos demais. As
condições que minimizam os impactos e riscos deste trabalho são garantidas pela
NR-31. Modificá-la para reduzir estes direitos é um desrespeito a saúde e a
vida de trabalhadores que vivem no limite da pobreza e da precariedade. E
contraria diversas experiências no campo que demonstram que pessoas trabalhando
em um ambiente digno, seguro e respeitoso são mais produtivas e ficam por mais tempo
nos seus empregos.
Luís Fernando Guedes Pinto,
engenheiro agrônomo e doutor em agronomia pela Esalq-USP é gerente do Imaflora
e membro da Rede Folha de Empreendedores Sociais.
Katia Maia, é socióloga e
Diretora Executiva da Oxfam Brasil.